BUGONIA (2025) - Yorgos Lanthimos | Your past is not a justification, and yet it is valid.

 There's an english version below! 

Aliens? Alien!

É algo além do lógico, do racional, algo que beira o surrealismo. O naturalismo na obra "Bugonia" é o que dá a tela para que a forma "mágica" da narrativa transforme a insanidade em realidade. Teddy é um personagem que busca uma fantasia criada por Lanthimos e que, corajosamente, confronta e serve de analogia frequente aos fóruns da internet.

A psicologia entende que o ser humano é um ser grupal. A convivência na sociedade é algo crucial, pois é o que transforma e modifica a mentalidade de uma pessoa que, em tese, está inserida em um grupo. Quero dizer que, ao se isolar, uma pessoa entra em uma constante queda de contato social; é algo que mexe com o físico e o psicológico. Em termos mais simples, uma pessoa que se isola e busca refúgio na tecnologia é, de fato, uma pessoa doente. E essa doença, alinhada às redes sociais, gera uma falsa sensação de poder.

E o que é o poder nesse caso? Os poderes alinhados a fóruns da internet são classificados como comunidades que, inicialmente, eram inofensivas. No entanto, a forma como usamos a internet é muito relativa, e aquele que, na realidade, se vê como inferior, tende a buscar "paz" no isolamento da internet. Nisso, entramos em um tópico sensível: como ocorre a manipulação de informações em fóruns da internet?

A resposta por si só é simples: pessoas mentalmente exaustas buscam um culpado por uma vida de fracassos. Algo assim se assemelha a técnicas de manipulação governamental, como, por exemplo, o que ocorreu com os judeus na Segunda Guerra Mundial. Portanto, a realidade cibernética agressiva é fruto de uma ideologia que necessita e implora para ser vista e, assim, essa atenção ganha repercussão não por características boas, mas pelas ruins — no caso de Teddy, uma ficção de que os alienígenas existiam. E o filme por si só é uma sátira da realidade. Teddy é um rapaz que foi maltratado, fato, mas todo o resto do mundo foi. A dor não é uma experiência singular, mas o que você faz com ela, sim. E, através disso, Lanthimos resolve utilizar uma analogia para criar um inimigo, curiosamente, com características femininas (inclusive, generalizadas, tornando qualquer mulher uma ameaça). É quando temos influências, quando tudo parece perdido, quando a dor é maior que a razão, que qualquer oferta de ajuda parece aquilo que você merece. No caso de fóruns que incitam a violência, suas consequências agridem inocentes, gerando crime para a sociedade, e a ironia de tudo: não irá acabar com a sua [dor] e o fato de ser um fracasso.

E, antes de entrar no nicho em que quero destacar, quero enfatizar uma parte crucial desse texto: em termos de sociedade, somos e sempre seremos formados por grupos. Digo isso pois é um fato que o ser humano, por ser racional, tende a se identificar por mais detalhes que outros seres vivos, como, por exemplo, grupos de amizades. Um grupo de amizade é formado por uma relação formal e informal de características que, distintas ou não, tornam a convivência algo agradável. Com isso, podemos expandir esse núcleo para a convivência social obrigatória, como um serviço, por exemplo. Tudo isso molda uma visão de vida que é fluída; a narrativa que se apresenta aos nossos olhos é algo que irá, inevitavelmente, carecer de um senso crítico.

Portanto, Yorgos Lanthimos apresenta um longa-metragem estético. E estético não é sobre fotografia, direção de arte, etc.; é sobre as escolhas figurativas. Teddy é fruto de um declínio social que se torna mental, mas isso não justifica seu ideal de violentar pessoas em prol de uma massa. Ao se alienar, Teddy não mais afeta somente a si, mas leva seu sobrinho Don ao longo do navio. Isso é uma tática usada para manipulação de ideais, muito utilizada em governos e ideias ditatoriais/extremistas, onde o objetivo é exterminar, ou melhor, inferiorizar pessoas por determinadas características — nesse caso, Michelle, personagem de Emma Stone.

Como citamos, a incapacidade de conviver em sociedade é um problema muito, mas muito válido. No entanto, a forma com que lidamos deve ser guiada por um suporte, pois, através da manipulação, é muito fácil uma pessoa cair em uma ilusão. E em "Bugonia", a psicologia do ódio é empregada de maneira individual, mas, na realidade, é cada vez mais um problema psico-social, onde o ser ativo daquela ideia se torna um criminoso. Mas esse ser criminoso normalmente mal pode reconhecer seus atos, pois, apesar de reais, ele está em uma realidade onde aquilo é o certo. E o mundo pode apontar o dedo, questionar... eis aí ter uma ironia na risada, no olhar: a maldade o consome, mas a participação em algo do gênero o satisfaz, mesmo com graves ressalvas.

Michelle, por sua vez, na estética do filme, representa a figura feminina como vítima do nicho que mencionei: a esfera de homens frustrados com uma realidade que eles mesmos criaram. Michelle é vítima da misoginia, esta mascarada pelo filme (propositalmente) para que a crítica seja feita de maneira cômica, uma característica assídua de Yorgos Lanthimos. Sendo assim, a personagem de Emma Stone é não somente uma alusão, mas também uma persona com uma personalidade própria. A carreira de Michelle por si só é uma agressão; essa agressão, cinematograficamente, mostra que sua moralidade e ética são sim questionáveis. E, através desse desenvolvimento, ela revela ser uma pessoa complexa, que entende da psique humana e poderia a qualquer momento ser confundida com uma personagem arrogante. Outrora, Lanthimos demonstra uma consciência narrativa que possibilita à personagem possuir erros, possuir questões controversas, e ainda assim ser uma vítima. Essa teia de aranha é o que engrandece o filme, que constantemente evidencia que seus personagens sofreram, erraram, e ainda assim possuem o livre arbítrio de cometer o erro ou aprender com ele.

"Se temas não garantem a qualidade de um filme, por que considerar 'Bugonia' um filme bom?" "Bugonia" transforma não somente a filmografia de Lanthimos em uma novidade; é um marco narrativo crucial que consolida o diretor como um típico — e bom — diretor hollywoodiano. É, além disso, um filme que critica e se posiciona politicamente através da sutileza, transformando até mesmo suas músicas, como a melodia de Chappell Roan, uma artista abertamente lésbica que leva a imagem feminina a uma visão completamente oposta à do antagonista: até mesmo nos detalhes do longa temos figuras que se posicionam contra a ideologia do machismo, expandindo inclusive para temas como racismo e homofobia. São detalhes como estes que mostram o amadurecimento e a coragem de Yorgos Lanthimos e toda sua equipe ao produzirem um filme como este.

O lado que mais me chamou atenção no filme de Yorgos Lanthimos foi como as raízes do cinema grego se mantiveram. Ele fez um filme que dialoga com o mercado americano, que soa como um filme americano, mas que manteve suas características culturais, como o gore, a violência explícita, o "nojo" como personagem, sendo algo que, mesmo dos EUA, se transforma em um filme autoral, um cinema indie; ou melhor dizendo, um cinema que delimita a introdução de carreira de Lanthimos, e o que é a linha tênue entre um diretor iniciante e um em desenvolvimento.

Por fim, "Bugonia" surge para mim como uma grande surpresa, pois, pessoalmente, achava os trabalhos anteriores de Lanthimos um pouco superficiais, rasos. Mas, como este filme, espero que muitos outros artistas possam surpreender. O trio Emma Stone, Yorgos Lanthimos e Jesse Plemons já está fazendo história no cinema, consolidando-se cada vez mais como referência de parcerias entre diretores e atores (leia aqui)!

ENGLISH: 

Aliens?...

It is something beyond logic, beyond reason, something bordering on surrealism. The naturalism in the work "Bugonia" provides the canvas upon which the "magical" form of the narrative transforms insanity into reality. Teddy is a character who pursues a fantasy created by Lanthimos and who, courageously, confronts and serves as a frequent analogy for internet forums.

Psychology understands that the human being is a group entity. Social coexistence is crucial because it is what transforms and modifies the mentality of a person who, in theory, is part of a group. I mean that, by isolating oneself, a person enters a constant decline in social contact; it is something that affects both the physical and the psychological. In simpler terms, a person who isolates themselves and seeks refuge in technology is, in fact, a sick person. And this sickness, aligned with social media, generates a false sense of power.

And what is power in this case? The powers aligned with internet forums are classified as communities that were initially harmless. However, the way we use the internet is very relative, and the person who, in reality, sees themselves as inferior, tends to seek "peace" in the isolation of the internet. This leads us to a sensitive topic: how does the manipulation of information occur on internet forums?

The answer itself is simple: mentally exhausted people seek a culprit for a life of failures. Something like this resembles government manipulation techniques, such as, for example, what happened to the Jews in World War II. Therefore, the aggressive cyber reality is the fruit of an ideology that needs and begs to be seen, and thus, this attention gains repercussion not for good characteristics, but for bad ones — in Teddy's case, a fiction that aliens existed. And the film itself is a satire of reality. Teddy is a young man who was mistreated, a fact, but so was the rest of the world. Pain is not a singular experience, but what you do with it is. And through this, Lanthimos chooses to use an analogy to create an enemy, curiously, with feminine characteristics (even generalized, turning any woman into a threat). It is when we are influenced, when everything seems lost, when the pain is greater than reason, that any offer of help seems like what you deserve. In the case of forums that incite violence, their consequences harm innocents, generating crime for society, and the irony of it all: it will not end your [pain] and the fact of being a failure...

And, before delving into the niche I want to highlight, I want to emphasize a crucial part of this text: in terms of society, we are and always will be formed by groups. I say this because it is a fact that the human being, being rational, tends to identify by more details than other living beings, such as, for example, friendship groups. A friendship group is formed by a formal and informal relationship of characteristics that, distinct or not, make coexistence something pleasant. With this, we can expand this nucleus to mandatory social coexistence, such as a job, for example. All of this shapes a fluid view of life; the narrative presented to our eyes is something that will inevitably lack critical sense.

Therefore, Yorgos Lanthimos presents an aesthetic feature film. And aesthetic is not about photography, art direction, etc.; it is about figurative choices. Teddy is the product of a social decline that becomes mental, but this does not justify his ideal of violating people for the sake of a mass. By alienating himself, Teddy no longer only affects himself, but leads his nephew Don along the ship. This is a tactic used for the manipulation of ideals, widely used in governments and dictatorial/extremist ideas, where the goal is to exterminate, or rather, inferiorize people for certain characteristics — in this case, Michelle, Emma Stone's character.

As mentioned, the inability to coexist in society is a very, very valid problem. However, the way we deal with it must be guided by support, because through manipulation, it is very easy for a person to fall into an illusion. And in "Bugonia", the psychology of hatred is employed individually, but in reality, it is increasingly a psycho-social problem, where the active being of that idea becomes a criminal. But this criminal being often can barely recognize their actions, because despite being real, they are in a reality where that is the right thing. And the world can point fingers, question... there lies the irony in the laughter, in the gaze: evil consumes them, but participation in something of the sort satisfies them, even with serious reservations...

Michelle, in turn, in the film's aesthetic, represents the female figure as a victim of the niche I mentioned: the sphere of men frustrated with a reality they themselves created. Michelle is a victim of misogyny, this masked by the film (purposely) so that the criticism is made in a comical manner, a characteristic assiduous to Yorgos Lanthimos. Thus, Emma Stone's character is not only an allusion, but also a persona with a personality of her own. Michelle's career in itself is an aggression; this aggression, cinematographically, shows that her morality and ethics are indeed questionable. And through this development, she reveals herself to be a complex person, who understands the human psyche and could at any moment be mistaken for an arrogant character. Furthermore, Lanthimos demonstrates a narrative awareness that allows the character to have flaws, have controversial issues, and still be a victim. This spider web is what elevates the film, which constantly highlights that its characters have suffered, made mistakes, and still possess the free will to commit the error or learn from it.

"If themes do not guarantee the quality of a film, why consider 'Bugonia' a good film?" "Bugonia" transforms not only Lanthimos's filmography into a novelty; it is a crucial narrative milestone that consolidates the director as a typical — and good — Hollywood director. It is, moreover, a film that criticizes and positions itself politically through subtlety, transforming even its music, like the melody by Chappell Roan, an openly lesbian artist who carries the female image to a vision completely opposite to that of the antagonist: even in the details of the film, we have figures that position themselves against the ideology of machismo, expanding even to themes like racism and homophobia. Details like these show the maturity and courage of Yorgos Lanthimos and his entire team in producing a film like this.

The aspect that most caught my attention in Yorgos Lanthimos's film was how the roots of Greek cinema remained. He made a film that dialogues with the American market, that sounds like an American film, but that maintained its cultural characteristics, such as the gore, the explicit violence, the "disgust" as a character, being something that, even from the US, transforms into an auteur film, an indie cinema; or rather, a cinema that delineates the introduction of Lanthimos's career, and what is the thin line between a beginning director and one in development.

Finally, "Bugonia" emerges for me as a great surprise because, personally, I found Lanthimos's previous works somewhat superficial, shallow. But, like this film, I hope many other artists can surprise. The trio Emma Stone, Yorgos Lanthimos, and Jesse Plemons is already making history in cinema, consolidating itself more and more as a reference for partnerships between directors and actors (read here)!

#awardseason #oscar #filmfestival #movies #cinephiles